ESTUÁRIO DA ESPERANÇA

07-02-2010 13:22

 

 

                         

 

A bruma do fracasso sustém e pavimenta a estrada do meu coti-

 diano. Contemplo quase inerte o curso da vida fluir bem próxi-

 mo de mim, embora nunca consiga de fato embarcar em seu

 convés. Não, não que eu tenha a pretensão de intendê-lo, domar

 o seu leme ao meu bel-prazer, não! Apenas queria estar presen-

 te a todo o roteiro da viagem: do começo ao fim.

 

 

Mas o quase, o quase sempre impertinente não me deixa nem se-

 quer partir. Então, engendro formas de lográ-lo; mas lá está ele,

 toda mão, um passo a frente: a me comediar caudalosamente.

 

 

Ele me alimenta a idéia, me faz erigir templos indicativos: caste-

 los de certeza. Todavia, toda feita, qual não é a minha surpre-

 sa. Descubro-os matéria inerme, insólida, tênue. Não, não são   

 alcáceres de rocha os meus castelos. O são de areia. Areia,

 cujo leve sopro despretensioso faz com que ela se desmanche     

 inteira.

 

Sim, depreendo claramente agora.

O meu caminho é água em ebulição:

 ele ferve, ferve, ferve até o sonho formar vapores,

 que se dispersam para longe, longe do alcance da minha tátil

 concreção. E a estrada: a estrada se transmuda plenamente

 em vácuos inteiros de asfalto da saudade daquilo

     que quase houve. Sim, ela se converte na malha 

       viária da abortagem: sim, me refiro áquela traiçoeira

            das engrenagens da desilusão!

 

 

JESSÉ BARBOSA DE OLIVEIRA